Pular para o conteúdo principal

Duas cenas paulistanas

A natureza humana, para os defensores de Schopenhauer, ou o corrompimento do ser humano provocado pela sociedade, para os rousseaunianos, está por trás de duas cenas até banais presenciadas na capital paulista nas últimas semanas. Quando conseguiremos deixar para trás a insolência e a arrogância?

Cena 1
À saída de uma escola particular, um garoto de uns 14 anos, caminha apressado em direção ao carro da mãe estacionado à porta. Lá de dentro da escola, um chamado tímido e abafado de uma garota da mesma idade: “Isaías, volta aqui”. Alguns passos resolutos e Isaías vira-se para a colega que pede: “vem conversar”. Isaías encerra a tensa despedida: “eu não vou conversar com você, você não concorda comigo”. E entra pela porta de trás do carro.

Cena 2
Depois de buzinar por quase um quarteirão para três carros e costurá-los para tentar avançar, a motorista barulhenta para no semáforo. Um dos condutores que ficaram para trás emparelha seu carro popular e já meio usado e diz: “você gosta de uma buzina, hein”. A bela jovem baixa o vidro e retruca: “eu gosto do meu carro, ele é chique, bonito, novo...”. “Mas não precisa buzinar tanto”, complementa o inferiorizado. “Ninguém sabe dirigir, a gente precisa ensinar”, finaliza a moça enquanto acelera.

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Negros e negras no voleibol olímpico brasileiro – uma análise sociodesportiva

Negros e negras no voleibol olímpico brasileiro – uma análise sociodesportiva Carlos Eduardo Bizzocchi Este breve ensaio não pretende de maneira nenhuma esgotar o assunto tampouco se aprofundar num tema que exigiria conhecimentos mais sólidos sobre sociologia ou etnografia e também uma pesquisa mais ampla. Ele é, de certo modo, um convite à discussão sobre o preconceito racial e sobre o efetivo papel inclusivo do esporte. O futebol brasileiro começou a romper a barreira da exclusão racial já na década de 1920 e, em pouco tempo, várias agremiações com negros e brancos dividiam espaço nos campos e espaços públicos. Na Copa do Mundo de 1954, a divisão étnica entre os titulares era quase meio a meio. Enquanto isso, o voleibol do país fechava-se dentro de clubes tradicionais, redutos conservadores e particulares, sob regimentos internos ainda impregnados do preconceito racial sobrevivente de uma abolição da escravatura que completava pouco mais de meio século. Aceito

Coração e competência

Crédito foto: CBV A seleção brasileira de vôlei dispensou a calculadora e fez as duas melhores partidas do Grand Prix na última sexta-feira (21) e, principalmente, ontem (23). Enquanto muita gente fazia contas e duvidava da capacidade de jogadoras e comissão técnica, elas mostraram que ainda há lenha para queimar debaixo da brasa que sobrou sob as cinzas da Rio-2016. Duas condições interdependentes do vôlei serviram para impulsionar a equipe: quem não é bom em determinado fundamento precisa criar sua identidade em outro; e não dá para ser competitivo com um fundamento que esteja abaixo do aceitável. O sistema defensivo se aprimorou na defesa e o contra-ataque contou com uma dose reforçada de paciência e malícia, enquanto a recepção, que não é um primor, comportou-se dentro de um nível aceitável e não permitiu que o adversário se valesse de tal fragilidade. Com um rendimento invejável no bloqueio, as comandadas de José Roberto Guimarães se superaram contr

O fator T

O fator T T de Tiffany, de transexual, de testosterona Apesar do recesso de fim de ano, a Superliga feminina de vôlei continuou nas manchetes. Nos dois últimos jogos, em que defendeu o Vôlei Bauru (SP) como titular, a oposta Tiffany, primeira transexual a disputar o torneio nacional, fez 55 pontos em nove sets. Nas mesmas rodadas, a oposta da seleção brasileira Tandara fez 24 pontos em sete sets defendendo o Vôlei Nestlé. Tiffany até 2015 disputava o campeonato holandês masculino. Após cirurgia para mudança de sexo, tratamento para redução da produção de testosterona e consequente liberação da Federação Internacional, disputou a reta final da Liga Italiana A2 pelo Golem Palmi no começo de 2017. Sua participação por lá gerou críticas e até ameaças de recursos na justiça comum pelos adversários. O programa Roda de Vôlei já havia levantado a questão da participação de Tiffany entre as mulheres num esporte em que a potência muscular predomina e decide. Apoiados na opinião d